INTRODUÇÃO
Somos missionários/as. Essa condição que nos foi dada no batismo, nos leva ao compromisso com o Reino de Deus. Por isso, aqui queremos recordar que, apesar da tentação de um estilo de vida cristã descomprometida dos nossos tempos, necessitamos voltar nossos olhos a Jesus e à Vontade do seu Pai. A Trindade tem presença na vida das comunidades com quem lutamos e partilhamos nossas esperanças e fracassos. É ali que encontramos a sua força para caminhar.
O NOVO QUE DESAFIA
A teologia cristã diz que, por nossa condição de batizados, todos/as somos missionários/as do Reino de Deus. Mas essa vida missionária não é fácil quando assumida desde a perspectiva do novo em situações onde imperam a desorganização social, a pobreza ou injustiça. No mundo de hoje, muitas vezes, nos encanta a novidade. Mas ela não convoca ao compromisso, é passageira. O novo, por outro lado, assusta e desafia. Enfrentar o novo é vivê-lo quase na intempérie. É o caminho da aventura, do arriscar-se na linha de fronteira onde não se vê o que está pela frente. Caminhar com o novo é entrar pela via do arriscado.
A missão também tem o caráter de novo na vida pessoal, onde o chamado de Deus toca as limitações da vida, como na vocação de Moisés, Elias, Jeremias. A missão passa pela experiência da entrega e da confiança. Na realidade, é Deus quem constrói a sua missão no mundo, passando pela vida dos discípulos/as. A missão de Deus acontece na vida da comunidade (dos discípulos/as) que realiza a vontade do “Pai”. Cada um faz o esforço pessoal na oração e na comunhão fraterna para viver este acontecimento.
A experiência missionária vai ensinando que é necessário entrar na lógica de Deus. Um caminho de atenção para saber qual é a sua vontade neste momento, e o que se espera da comunidade em concreto. Sempre vai ser uma tensão da comunidade de fé. Somos peregrinos que buscamos a Deus, passando por encontros e desencontros, onde, às vezes, somos fiéis e outras, infiéis.
OS CAMINHOS DA FÉ
Uma missão a gente nunca inicia e nunca termina. Nunca fomos os primeiros e nem seremos os últimos. Estamos de passagem. Ao chegar, sempre encontramos as primeiras trilhas estabelecidas por aqueles que já fizeram o seu caminho. Esses trabalhos nem sempre são visíveis porque os caminhos de fé nem sempre são edificações concretas. São organizações feitas e desfeitas no passado e que estão presentes na memória dos que viveram ou que escutaram essas historias vividas. Elas serão o alicerce para o caminho seguir adiante. A visibilidade somente acontece quando expressada, por isso é necessário que essas histórias sejam contadas e escutadas.
Assumir a responsabilidade com essas historias nem sempre traz segurança para o iniciante, que nem sempre acredita que houve alguma coisa antes dele. No entanto, é o caminho por onde Deus passa e deixa marca com e no meio do povo. Como missionários, somos buscadores destes caminhos. Deus constrói sua historia e se queremos segui-lo, necessitamos encontrar as sementes semeadas. Os pequenos brotos de plantas ficam no meio da comunidade quando esta ficou debilitada. Eles voltam a crescer ao ser retomados e reorganizados.
Como seres humanos, sonhamos com grandes projetos, como construir missão, formar comunidades para que as pessoas melhorem de vida, pensar na própria na vida, desenvolver as capacidades de percepção para ver melhor a realidade. No entanto, esses caminhos necessitam da sintonia de vários elementos ao mesmo tempo para que possam se desenvolver, e da vivência cotidiana com atenção: o ideal, o objetivo com que assumimos nossa tarefa, o amor primeiro, a realidade, cumprir a vontade de Deus e outros.
A opção que assumimos ou o amor primeiro é um elemento que deve estar presente nas decisões diárias porque a realidade sempre é muito complexa e as coisas podem fugir de nosso controle. As contínuas transformações podem nos desorientar e desviar-nos do caminho assumido. Muitas vezes, no deserto, as tentações aparecem como meios fáceis de encurtar caminhos e chegar depressa. É necessário permanecer em sintonia com a missão de Deus nessa jornada. A escuta permanente a Deus e à realidade se complementam nessa dinâmica de vida. A vida se faz oração.
Saber o que Deus quer. Fazer a vontade de Deus é realizar aqui o Reino de fraternidade. Jesus mostrou a seu povo como fazer vontade de Deus, falando em parábolas. Falou de sementes, de luzes, de fermentos, do filho pródigo, da semente de mostarda… Sempre falou de coisas pequenas e de atitudes significativas. Portanto, estar em missão é assumir uma posição de encontro, de escuta ao pé da porta onde Deus fala ao coração das pessoas; de caminho com quem já caminhou em comunidade, guardando historias na memória. As palavras já vividas, contadas, devem ser transformadas em historias comunitárias (eclesiais) pela ação dos discípulos/as. A memória empurra o presente para concretizar o novo, levando ao encontro de Deus vivo. O seguimento e a missão são o compromisso de recordar, fazer a vontade da Santíssima Trindade na vida fraterna com a qual nos comprometemos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Uma das características bíblicas que garantem a fidelidade é a garantia da memória. Não esquecer o caminho iniciado. O protagonismo, próprio da sociedade atual, leva qualquer pessoa, bem intencionado ou não, a perder o principio ou o objetivo da vida cristã. Assume-se o pragmatismo como natural; seguir em frente sem nenhuma avaliação critica do caminho feito.
A fidelidade exige olhares em varias direções: olhar sempre para trás, para rever a memória, a vida vivida; olhar para frente, para ter presente o objetivo do trabalho pastoral ou missionário; olhar para os lados, para levar em conta os que acompanham, os companheiros (os que comem o pão juntos); olhar para cima ou para o horizonte com a certeza de que somos mais que seres que se acabam nesta terra. A missão não significa somente uma coleção de palavras bem elaboradas, mas um projeto de vida. Ela é um caminho de comer pães juntos (companheiros/as).
Por isso, fazer a vontade de Deus é um caminho onde se vão tecendo muitos fios para se fazer o grande tecido, que é a missão, que deve confundir-se com a própria vida. Um desenrolar lento que no ritmo do caminhar, escutando as historias e buscando elementos que permitem construir a mesa fraterna, para comer pães juntos (companheiros). Avançamos e retrocedemos em busca do futuro insistentemente. A fé exige sempre estar olhando para frente com esperança, apesar da desesperança.
Pe. Antonio Carlos Meira, MSC é missionário no Equador.