Revista de Nossa Senhora
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Edição de Março de 2014

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Questão de amor aceito

1131297_70651567Acreditar em Deus e no seu amor infinito, experimentá-lo como quem o prova aos poucos e, em retribuição, amá-lo com o maior amor humano possível, às vezes, com a decisão de renunciar até ao mais bonito amor humano.. 

Encontrar uma pessoa e amá-la com um amor gentil e sem reservas, conseguir amá-la sem adorá-la e, mesmo assim, saber que nela está quase tudo o que se buscou de bom neste mundo. 

Santificar-se nesses amores e viver mais para os outros do que para si mesmo.

Passar estes amores a quem cruzar os nossos caminhos: eis o chamado da maioria dos mortais. 

Feliz aquele que ama e se sente amado.

Feliz aquele que aceita não ser amado como gostaria, mas assim mesmo ama.

Feliz de quem, mesmo não tendo o amor que sonhou um dia encontrar, ama de maneira maiúscula e madura. 

De tal ser humano pode-se dizer que se tornou pessoa. 

Pe. Zezinho, SCJ

Batom nos paramentos

Deep prayerO primeiro pensamento que me  ocorreu é que estava diante  de uma “novidade”

Em nossa comunidade paroquial, o pároco nomeou cinco ministros extraordinários da Palavra. São três mulheres e dois homens. Quando o sacerdote está ausente – pois tem várias tarefas na diocese e atende a outra comunidade distante, com a doença do pároco local -, cabe a nós, os ministros, exercer a função de moderadores das celebrações e fazer as reflexões sobre o Evangelho.

Outro dia, ao vestir a túnica própria dos ministros, notei a mancha de batom na gola. O primeiro pensamento que me ocorreu é que estava diante de uma “novidade”, uma possibilidade aberta pelo Concílio Vaticano II: a presença da mulher em ministérios supletivos da ação dos ministros ordenados.

De fato, o novo Código de Direito Canônico [1983], reformado após o Vaticano II, foi citado por João Paulo II em sua Encíclica sobre a “Vocação e Missão dos Leigos na Igreja e no mundo” [Christifideles Laici]: “Onde as necessidades da Igreja o aconselharem, por falta de ministros, os leigos, mesmo que não sejam leitores ou acólitos, podem suprir alguns ofícios, como os de exercer o ministério da Palavra, presidir às orações litúrgicas, conferir o Batismo e distribuir a Sagrada Comunhão”. (ChL, 23.)

Naturalmente, continuamos leigos. Como alerta a mesma Encíclica, “o que constitui o ministério não é a tarefa, mas a ordenação sacramental. Só o sacramento da Ordem confere ao ministro ordenado uma peculiar participação no ofício de Cristo, Chefe e Pastor, e no seu sacerdócio eterno”.

É verdade, ainda, que os fiéis preferem a presença do sacerdote; especialmente os mais idosos experimentam certa dificuldade diante de ministros leigos nas celebrações, ainda que só nos apresentemos ali como extensões, em caráter supletivo, do próprio ministério do sacerdote.

Voltando à mancha de batom (a gola é mesmo estreita e justifica os traços vermelhos…), o Papa João Paulo II falou à Igreja sobre a “presença e colaboração dos homens e das mulheres” (ChL, 52), lamentando a “presença demasiado fraca dos homens”. Devo citar por extenso o que ele escreveu:

“A razão fundamental que exige e explica a presença simultânea e a colaboração dos homens e das mulheres não é unicamente [...] a maior expressividade e eficácia da ação pastoral da Igreja; nem tampouco o simples dado sociológico de uma convivência humana que é naturalmente feita de homens e mulheres. É, sobretudo, o desígnio originário do Criador, que desde o ‘princípio’ quis o ser humano como ‘unidade a dois’, quis o homem e a mulher como primeira comunidade de pessoas, raiz de todas as outras comunidades e, simultaneamente, como ‘sinal’ daquela comunhão interpessoal de amor que constitui a misteriosa vida íntima de Deus Uno e Trino.”

Se as manchas vermelhas se repetirem na gola da “nossa” túnica, continuarei dando graças a Deus pela preciosa presença feminina em nossas comunidades.

Ademais, não me lembro de ter ouvido nenhuma queixa quando os paramentos de antanho tinham apenas manchas de cinza e o aroma típico dos cachimbos e dos cigarros.

Não sejamos machistas…

Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança

Onde Reencontrar a Beleza

Atualidade Liturgica-Pe. MichelNa Verdade “Arte é Beleza e a Beleza é o resplendor da Verdade, sem verdade, não há Arte.” Disse o arquiteto espanhol Antonio Gaudi.

A Beleza que procuramos, aquele lugar onde Deus brilha, deve ser um lugar verdadeiro. A arquitetura deve ser verdadeira. A liturgia deve ser verdadeira. Nós devemos ser verdadeiros.

Devemos buscar a verdade naquilo que nos é autêntico.

Procurar a verdade manifestada nas raízes religiosas das culturas locais, na nossa realidade concreta sem querer imitar outras culturas e outras realidades.

Para dar um exemplo, o Brasil tem uma grande quantidade de excelentes artistas de arte naïf; essa modalidade artística tem uma força extraordinária que vem de sua sinceridade e simplicidade.

No dicionário, naïf quer dizer aquilo que retrata simplesmente a verdade, a natureza, sem artifício, sem esforço; que é graciosamente inspirado pelo sentimento. No Brasil só existe um museu de arte naïf, localizado no Rio de Janeiro. Brasileiros não compram essa arte, só os estrangeiros a valorizam. Nós não

valorizamos nossa própria arte, nossa própria beleza, nossa verdade.

Devemos buscar a verdade na centralidade da liturgia.

Há um centro em nossa vida, na vida de nossa comunidade, na liturgia que celebramos, e no espaço onde celebramos? Há um eixo comum? Esse centro é coincidente?

Se o centro da nossa vida e da nossa liturgia não for o Mistério Pascal, o espaço o denuncia. Assim encontramos espaços onde o centro é a presidência, ou o padroeiro, ou Nossa Senhora, ou o sacrário, ou os arranjos florais, ou ainda o dízimo, mas não o Mistério Pascal.

A Igreja nos pede espaços que possibilitem a participação ativa dos fiéis. Já sabemos que a forma longitudinal não possibilita isso, não há como participarmos se não nos vemos, se só enxergamos as costas uns dos outros. Sabemos que a forma circular é ideal para a participação ativa. O círculo se dá a partir de um centro. Ele se desenvolve obrigatoriamente a partir de um centro. A liturgia gira em torno de um centro e é para esse centro que tudo converge.

Este centro é o Cristo. Devemos buscar a beleza na essência. E fugir da simples aparência.

Pe. Michel dos Santos, MSC é vigário paroquial de N. Sra da Soledade em Delfim Moreira/MG

A experiência da intimidade

9662914625_c8035036e4_oEm nossa Congregação, Ninguém é hóspede casual, Ninguém é estrangeiro; Somos todos irmãos No único Coração de Cristo. Pe. Júlio Chevalier, 1897

Fico imaginando quão grande e profunda foi a experiência do padre Júlio Chevalier com o amor de Deus. Uma experiência de amor desta dimensão só pode acontecer a partir da intimidade. Foi no contato íntimo com o Deus da vida que o padre Júlio Chevalier descobriu o Coração de seu Filho. Jamais uma relação frágil e rasa geraria um coração disposto a se doar pelo bem dos outros.

A vivência profunda do mistério amoroso de Deus transcende o nível do romantismo e do sentimentalismo e impulsiona o homem a ir além. Júlio Chevalier percebeu que não bastava mais sentir-se amado por Deus, era necessário levar outras pessoas a fazerem a mesma experiência.

Penso que o nosso fundador sentia o Coração de Cristo como uma casa, um lar, uma morada, lugar de repouso e descanso. Era o ponto de chegada e também de partida. Como não poderia ser diferente, o Coração do Divino Filho se tornou para ele o centro de onde tudo se irradiava.

Lembro-me de que na casa de meus pais, no interior de Minas, a sala de estar precisava ficar sempre limpa e arrumada por causa das visitas, mas quando era uma pessoa próxima da família que chegava, logo era levada para a cozinha, muitas vezes entrava até mesmo pela porta dos fundos. Não tinha problema se a cozinha não estava bem organizada, aquela pessoa fazia parte da nossa intimidade.

A cozinha é um lugar de intimidade para uma família mineira, diz muito dos hábitos e das pessoas que moram ali, levar alguém para dentro era como dizer: “você é de casa”. Mas não era qualquer pessoa que chegava pelos fundos ou que entrava na casa inteira; minha mãe sabia muito bem quem fazia parte da nossa intimidade.

Penso que o padre Júlio descobriu isso, sei que ele descobriu no Coração de Cristo o lugar da intimidade. Todos quantos quiserem ir ao mais profundo de Cristo devem dirigir-se ao seu Coração. Lá é o lugar de onde emanam todas as graças, é também o lugar da aprendizagem.

Desta relação é que aprendi o que o nosso fundador quis ensinar ao dizer que em nossa Congregação ninguém é hóspede casual ou estrangeiro. Ele quis nos mostrar que, como homens do Coração de Cristo, somos levados a mostrar também o nosso coração. Por isso, acolher, receber bem, alegrar-nos com a presença de um irmão, faz parte do nosso carisma como ponto essencial, como pertença de algo vivido e que nos foi transmitido. E aqueles que se aproximam da intimidade MSC, da nossa cozinha, percebem quão frágeis somos nós, quanta humanidade há em cada um, mas percebem acima de tudo qual Coração queremos imitar.

Com o nosso coração simples, humano e acolhedor, queremos levar todas as pessoas à mesma experiência de amor e acolhida feita um dia pelo nosso fundador e que, como seus filhos, um dia também nós fizemos e que agora buscamos transmitir.

Fr. Girley de Oliveira Reis, MSC é seminarista e cursa o 4º ano de Teologia na PUC/São Paulo-SP