Revista de Nossa Senhora
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Salmos

peach flowers and reflection over whiteQuando os salmos me surpreendem com sua música
E as antífonas se tornam prece,
O Espírito canta; o fundo de minh’alma cai.

E do centro de meu porão, Amor, mais alto que o trovão
Abre-se um céu de ar desnudo.

Novos olhos despertam.

Envio o nome do Amor ao mundo com asas
E canções crescem ao meu redor como uma selva.
Coros de todas as criaturas entoam as melodias
Que o Teu Espírito toca no Éden.

Thomas Merton
(2015, 100º Aniversário do autor)

 

Março de 2015

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Uma Igreja maternal

SONY DSCTenho muitos amigos que pertencem a outras Igrejas cristãs. Não me lembro de nenhuma briga por causa de nossas diferenças. O respeito mútuo é a garantia da paz.

Em mais de 30 anos de serviço de aconselhamento, tive a ocasião de atender a muitos protestantes, evangélicos e pentecostais, inclusive alguns pastores e esposas de pastores. E sempre foram acolhidos como irmãos.

Sim, aprendi muita coisa boa no convívio com eles, em especial o valor que dão à Palavra de Deus e ao anúncio do Evangelho, em contraste com a atitude “descansada”, às vezes omissa, do católico tradicional.

Existe, porém, um ponto em que sou muito grato a Deus por ser católico. Trata-se da presença feminina e maternal da Virgem Maria, Mãe de Deus. Esta presença é garantia de um clima afetuoso que ainda não pude perceber em nenhuma das outras denominações cristãs.
Lembro-me dos anos de colégio interno, longe da família natural, de onde a vida me arrancara aos dez anos e meio de idade. Por volta do 3º ano ginasial (aos 13 anos de idade), a solidão rondava meu coração. Havia muitos pais, pois os padres-mestres assumiam esta figura. Mas só existia uma única Mãe…

Eu a encontrava na capela. Ao pôr do sol, já na penumbra, eu me ajoelhava diante de Nossa Senhora do Belo Ramo. Toda branca, com seu porte de matrona romana, ela trazia no colo o Menino que estende o ramo salvador. E se havia, no seu colo, um espaço para o Menino, por que não haveria espaço para mim?

Era assim que a paz voltava ao meu coração e o sentimento de solidão ia-se esvaindo docemente enquanto a noite chegava. Eu não estava sozinho. A Mãe estava presente…

Em geral, meus irmãos católicos, acostumados desde a infância com a figura materna de Maria, nem imaginam a diferença que isso faz: uma religião com amplos espaços para os sentimentos e as emoções, o carinho e a ternura. Uma religião que não se esgota no abstrato, no intelectual, no espiritual…

Falar de Maria é falar da Encarnação do Verbo que decidiu entrar em nossa carne e, por isso mesmo, quis precisar de mãe humana. Assim, em comparação com as demais famílias cristãs, é sem dúvida a católica aquela que mais acentua o mistério da Encarnação.
E na carne dos homens e mulheres pulsam bem fundo os sentimentos e as ternuras de todos os filhos.

Eu inclusive…

Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

Vencer o mal pelo Bem

destaque2O crescente processo de desumanização que atinge a sociedade contemporânea é assustador. Tem origem diversa – da violência à indiferença, da corrupção ao conformismo com situações aviltantes da dignidade humana. Debelar o avanço desta desumanização deve ser preocupação cidadã. O Papa Francisco, na Exortação Apostólica Alegria do Evangelho, adverte sobre o risco de atingirmos níveis irreversíveis deste processo. Por isso mesmo, não se pode simplesmente constatar, lamentar ou defender-se de maneira egoísta e mesquinha de suas consequências. Ora, se o medo e o desespero tomam conta do coração das pessoas, compromete-se, gravemente, a vivência da fraternidade.

Com isso, a humanidade se distancia do compromisso com a solidariedade, eficaz remédio para redesenhar os cenários de injustiça que escravizam tantas pessoas.

Para mudar essa realidade, são importantes as complexas estratégias no âmbito da segurança pública, dos reajustes de funcionamentos e em outros tipos variados de dinâmicas, pois o descontrole, gradativamente, toma conta de tudo. No entanto, embora fundamentais, essas estratégias não são suficientes. Estatísticas diversas comprovam que a sociedade convive com um excesso de incivilidades, consequência do processo de desumanização. Processo alimentado pelo desejo sem limites de apossar-se das coisas e pela busca irracional do prazer. São impulsos que viciam e impedem as grandes conquistas. As maiores vitórias, para serem alcançadas, requerem sacrifício ou esforço maior.

Muitas vezes, exigem que se reparta e se ofereça o tempo e as próprias posses para quem não os têm.

As instituições religiosas, educacionais, particularmente a família, os ambientes variados de trabalho, também os de entretenimento e lazer, precisam readotar princípios simples, com força educativa e incidente na vida de cada pessoa. Somente assim é possível estabelecer um contraponto à desumanização que faz multiplicar a violência. Entre esses princípios está um de grande alcance e significativa força educativa:

“Não te deixes vencer pelo mal, vence antes o mal com o bem”, exortação de São Paulo na Carta aos Romanos. A adoção séria deste princípio, incidindo nos contextos comuns da vida, poderá transformar as relações entre as pessoas. Só o bem derrota o mal, em uma longa batalha que inclui o apreço pela fraternidade, em lugar das guerras; adoção de atitudes simples e generosas, em vez de mesquinharias e fofocas.

O bem como princípio é vetor determinante na promoção da paz. Nesse horizonte, é necessário redobrar a atenção e analisar as tragédias provocadas pelo mal, que se alastra com muita facilidade. Suas raízes precisam ser conhecidas e extirpadas. Nesta tarefa, fundamental é refletir sobre a liberdade humana, que é um bem, mas, não raramente, torna-se porta de entrada para o mal que dizima vidas, destrói projetos e prejudica as relações. A experiência maravilhosa da liberdade não pode ser pautada apenas pelos critérios e interesses políticos ou sociais. É preciso incluir aportes de caráter espiritual para não assorear a fonte indispensável da ética, que inspira condutas orientadas pelo bem.

Há uma gramática da lei moral que encanta o coração para viver de modo amoroso e, consequentemente, convencer-se de que é necessário vencer o mal pelo bem. Essa gramática da lei moral é o amor único, capaz de iluminar para além da inteligência, de encontrar motivos maiores que os oferecidos pela razão e de conseguir ver além dos limites e estreitezas do humano. Capacita todos para enxergar a dignidade fascinante de cada pessoa, merecedora de todo respeito, deferência e cuidado.

Investir mais na aprendizagem da gramática da lei moral é urgente. Trata-se de experimentar o amor fraterno e solidário, edificando em cada pessoa uma interioridade que a torne sensível aos mais pobres, comprometida com o bem dos sofredores e a promoção da justiça. Não basta, pois, a sofisticação de aparatos externos que, por si só, são insuficientes para mudar quadros trágicos mundo afora, incluindo aqueles nos quais estamos inseridos. Os cenários que afligem serão redesenhados com a gramática da lei moral, com a força do amor, na medida em que for aprendido e vivenciado o princípio de que se deve sempre vencer o mal pelo bem.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo. Arcebispo de Belo Horizonte (MG)

Amar é diferente

Trauerkarte oder Beileidskarte mit Kreuz und Herz aus HolzCom sua exposição de corpos, de nudez frontal, de sexo explícito e de solicitações ousadas e atrevidas de sexo em novelas, em programas de televisão e no cinema, em provocações visuais a cada esquina, o mundo atual jogou sobre as cabeças de homens e mulheres e adolescentes uma noção de corpo e de sexo que não envolve alteridade nem diálogo. E sexo deveria ser diálogo.

Nada disso é novo. Está descrito no livro do na descrição das lascívias de Sodoma e Gomorra. (Gn 18,20 – 26; Dt 29,23) Entre os gregos já se agia desta forma. Só não havia os recursos midiáticos de agora. Para muitos, é coisa da hora, daquela noite, daquela semana, daqueles momentos. São atos que não se tornam relações. Ele quer prazer e por enquanto serve o corpo dela; ela quer prazer ou dinheiro e por enquanto serve o corpo dele, ou de mais pessoas. Da mesma forma que na Grécia e em Roma 400 a 300 a.C., em muitos ambientes de agora, sexo não vincula. São encontros sem diálogo afetivo e relações sem vínculo.

Para muitos jovens e adultos uma coisa é o envolvimento físico, outra o amor. Transa ainda não é diálogo, relação sexual ou relações sexuais ainda não são relações estáveis nem relações de matrimônio. Não há entrega. O que há são prestações. Leva-se o produto antecipadamente, mas sem garantia de ficar com ele. Experimenta-se sem garantia de pagar. É o mundo da emoção, do prazer, da sensação e, também, o da satisfação momentânea; beija-se, abraça-se como se come um chocolate. Havendo coisa melhor, comerão aquela nova coisa…

O amor é bem outra coisa. Quem ama mira acima e para além da genitália. No amor o sexo não ocupa o centro da relação. O verbo do amor é cuidar e assumir. No amor, transar fica para depois. Aquele que ama não se fixa apenas no prazer, nem somente na aparência, nem se fixa no momento. Contempla um possível depois, porque amor é sentimento que leva ao outro e que o eleva. É ternura que invade e pervade os dois de tal maneira que ela, a mulher, se torna um pouco ele e ele, o homem, se torna um pouco ela. Nenhum se imagina sem o outro e nenhum se vê dando-se dessa forma a outra pessoa.

Por isso e muito mais é que o sexo é repetitivo e o amor é criativo. Há muito mais criatividade num “eu te amo” do que naquelas revistas de banca de esquina. Mas quem vai ensinar isso a quem nunca parou para pensar nos valores que tem para dar aos outros? Será ouvido? Um dos maiores dramas de nosso tempo é o que atingiu Sodoma e Gomorra. Sexo sem alteridade! Ligue sua televisão e conclua!

Pe. Zezinho. SCJ, é músico e escritor. Tem aproximadamente 85 livros publicados e mais de 115 álbuns musicais.
www.padrezezinhoscj.com