Revista de Nossa Senhora
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Chorar diante do Sacrário

Publicado em 30 de setembro de 2015 / Reportagens >

interna-out-3Duas irmãs foram ao mesmo templo, assistir às mesmas cerimônias, falar ao mesmo Deus e ouvir o mesmo pregador. Uma era emotiva e a outra reflexiva. A formação pessoal assimilada, o grau de escolaridade e o temperamento fizeram a diferença.

A emotiva, cujas lágrimas afloravam por qualquer mexida de alma, chorou cinco vezes, levou as mãos ao peito a cada novo comando, fechou os olhos quinze vezes. Obedecia a todas as sugestões do pregador que acentuava fortemente a religião do clamor. Molhou dois lenços. Voltou para casa sentindo que, outra vez fora tocada pelo Espírito Santo, pela Palavra de Deus e pela palavra do pregador.

Sua irmã, que veio com o marido e a filha adolescente, ouviu tudo serenamente, não pôs as mãos no peito, não fechou os olhos, discordou de algumas colocações do pregador sobre educação dos filhos e sobre política, concordou com outras e processou, ali mesmo, todas as informações que recebia.

Advogada que era, viu valor em algumas reflexões e achou outras simplistas demais. O pregador evidentemente não era versado nem em psicologia, nem em sociologia. Falou de demônio cinco vezes e em contexto questionável. Nem todo desvio de conduta é artimanha de satanás. Saiu de lá sentindo-se tocada por Deus, porque pôde refletir mais uma vez sobre a dor humana e porque, mesmo não tendo vertido uma lágrima, ouviu o suficiente para prosseguir sua luta diária na sua profissão de defender e aproximar pessoas.

Chorar e emocionar-se nem sempre é sinal de toque do céu, mas pode ser. Ficar impassível e não molhar, nem mesmo o canto dos olhos, não é sinal de que o fiel não foi tocado por Deus. Nem sempre religião rima com emoção e nem sempre piedade rima com impassibilidade. Cada caso deve ser analisado.

Quanto aos pregadores que carregam pesadamente na emoção do povo e lhe massageiam o coração, poderiam, ao menos algumas vezes, falar para a cabeça e massagear o cérebro. Precisamos de sentimentos preferivelmente profundos e não à flor da pele. Precisamos de pensamentos igualmente sólidos e profundos.

De um pregador americano de “revivals”, que acreditava em clamores e lágrimas e investia pesadamente no quesito lágrimas, comenta-se que, ao invés de dizer “oremos”, a depender do que dizia, exclamava “choremos”. Um painel na parede acendia com as letras “Let us pray” ou “Let us cry”. E o povo chorava alto, a cada novo comando. Ele rimava religião com emoção. Seus fiéis, também! Se era o melhor pregador aquela igreja? A resposta está em mais de vinte livros de psicólogos que analisam o sentimento e a emotividade das massas. Um dia eu talvez escreva um com o titulo: “Chorar diante do sacrário”. Podem ter certeza que não será negativo. Tudo depende do antes e do depois daquelas lágrimas…

Pe. Zezinho, SCJ, é músico e escritor. Tem aproximadamente 85 livros publicados e mais de  115 álbuns musicais.
www.padrezezinhoscj.com