Revista de Nossa Senhora
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A função pastoral da arte na evangelização

atualidadeliturgicaO grande poder da arte sacra de comunicar torna capaz de ultrapassar as barreiras e os filtros dos preconceitos para unir o coração dos homens e mulheres de outras culturas e religiões e, ao seu modo, acolher a universalidade da mensagem de Cristo e seu Evangelho.

As obras de arte são inspiradas pela fé cristã – pinturas e mosaicos, esculturas e arquiteturas, marfins e pratas, poesia e prosa, obras musicais e teatrais, cinematográficas e coreográficas e muitas outras – têm um enorme potencial, sempre atual que não se deixa alterar pelo tempo, que passa: comunicam de maneira intuitiva e agradável a grande experiência da fé, do encontro com Deus em Cristo, no qual se revela o mistério de amor de Deus e a profunda identidade do homem.

São João Paulo II definia o patrimônio artístico inspirado pela fé cristã como “um formidável instrumento de catequese”, fundamental para “novamente lançar a mensagem universal da beleza e da bondade”.

Também a imagem é pregação evangélica. Os artistas de todos os tempos ofereceram à contemplação e à admiração dos fiéis os fatos salientes do mistério da salvação, apresentando-os no esplendor da cor e na perfeição da beleza. Isso é um indício de como hoje, mais que nunca, na civilização da imagem, a imagem sagrada pode exprimir muito mais que a própria palavra, uma vez que é muito eficaz o seu dinamismo de comunicação e de transmissão da mensagem evangélica.

O grande poder da arte sacra de comunicar torna capaz de ultrapassar as barreiras e os filtros dos preconceitos para unir o coração dos homens e mulheres de outras culturas e religiões e, ao seu modo, acolher a universalidade da mensagem de Cristo e seu Evangelho. Sendo assim, quando uma obra de arte, inspirada pela fé, é oferecida ao público no quadro da função religiosa, essa arte se revela como uma mediação, um caminho pastoral de evangelização e diálogo, que possibilita saborear o patrimônio vivo do cristianismo e, ao mesmo tempo, a própria fé cristã.

Reler as obras de arte cristã, grandes ou pequenas, artísticas ou musicais e recolocá-las no seu contexto, aprofundando seus vínculos vitais com a vida da Igreja, em particular com a liturgia, quer dizer fazer “falar” novamente tais obras, permitindo-lhes transmitir a mensagem que inspirou sua criação. O caminho da beleza, tomando o caminho das artes, conduz à verdade da fé, ao próprio Cristo, tornado com a Encarnação, ícone do Deus invisível”. João Paulo II não hesitou em manifestar sua “convicção de que, num certo sentido, o ícone é um sacramento: analogamente, de fato, como sucede nos sacramentos, o ícone torna presente o mistério da Encarnação em um ou outro aspecto.”
Pe. Michel dos Santos, MSC, é vigário paroquial de N. Sra da Soledade em Delfim Moreira/MG

MARIA exemplo de alegria

mariaTodas as qualidades de Maria convergem para o amor que o Pai pôs no seu coração de jovem, escolhida e predestinada, a ser a Mãe do Salvador. Dentre suas qualidades podemos destacar a alegria. Na ladainha a invocamos como “causa de nossa alegria”.

A celebração do Ano Litúrgico ajuda-nos a revigorar a nossa fé. Acompanhando os mistérios da vida do Salvador, podemos vivenciar o dinamismo do amor divino que nos transforma e nos mantém no caminho da salvação.

O dia 20 de abril deste ano foi, para todos nós cristãos, “o dia de Júbilo, da Festa, do ALELUIA, da RESSURREIÇÃO DO SENHOR”. Em todas a Igrejas ressoou a proclamação da Páscoa, quando o ministro, com voz forte e vibrante, proclamou a vitória do Rei Jesus Cristo: “Exulte de alegria a multidão dos anjos, exultemos também nós por tão grande louvação. Cristo está vivo para sempre”. A alegria da Ressurreição nos contagia e fortalece a nossa vida em meio a este mundo tão dividido, tão marcado pela violência e pelo pecado. Mas, a Vida vence a morte, o Amor supera o ódio. A vitória de Cristo é também nossa vitória. “A Páscoa é o cerne, o ponto de partida e de chegada do ano Litúrgico, da razão de ser de cada cristão, da missão e da própria Igreja. Razão e sentido de nossa fé: “SE CRISTO NÃO RESSUSCITOU É VÃ A NOSSA FÉ…” (cf.I Cor 15,13-14.17.20).

Pensando na vitória de Jesus, vivo no meio de nós, podemos pensar em Maria como aquela que soube viver a alegria de ser toda de Deus. Sua alegria é sinônimo de firmeza, de fé inabalável e confiança em Deus. Não é fruto de euforia passageira, mas, um sentimento constante de estar em Deus. Muitas vezes passou por momentos de intenso sofrimento, mas, a alegria em doar-se e assumir a missão conservaram sua força a fim de manter-se “de pé” como nos diz o Evangelista João (cf.Jo 19,25). Maria, mesmo abatida por tanto sofrimento, foi para a casa de João com o coração repleto de alegre satisfação pela fidelidade de Jesus e por ter recebido dele a missão de ser mãe de todos nós. Prova de fidelidade é a sua constante presença junto aos apóstolos mantendo-os congregados, em oração, esperando aquele que Jesus havia prometido – o Espírito da Verdade.

Em Maria fé e alegria formam uma unidade. No Hino do Magnificat, ela revela seu grande contentamento e a profundidade de sua fé, ao receber a saudação de sua prima Isabel: “Bendita és tu entre as mulheres”, “Bendita és tu que acreditaste.” “Bendito é o fruto do teu ventre!.” E Maria disse:. “A minha alma engrandece o Senhor e meu espírito exulta de alegria em Deus meu Salvador… …porque olhou para a humildade de sua serva, doravante todas as gerações hão de chamar-me de bendita. Ele sacia de bens os famintos, despede os ricos sem nada. Acolhe Israel, seu servidor, fiel ao seu amor.” (cf. Lc 1,46ss)

É neste hino que Maria se revela de maneira impressionante como filha do povo e como Mãe do Salvador que vinha para salvar o povo. “Maria participa da dupla condição de seu povo. Faz parte da imensa multidão dos pequenos e pobres e ao mesmo tempo se entrega humildemente nas mãos de Deus como serva. Proclama o imenso amor de Deus e a sua ação transformadora sobre as relações humanas impulsionadas pela vinda do Reino.” (Irmão Afonso Murad no seu livro: Quem é esta mulher?)

É impossível contemplar Maria como exemplo de alegria e não experimentar o desejo profundo de imitá-la. Oxalá aprendamos com ela a ser fiéis na alegria, a fim de levar aos irmãos e irmãs a alegria que vem do coração: “a alegria humilde, alegria que não ofende o sofrimento e o desespero, uma alegria mansa e bondosa,” como nos sugere nosso querido papa Francisco em um de seus pronunciamentos. Assim deve ter sido a alegria de Maria, humilde, amorosa, fraterna, pronta e atenta, como ela nos ensina.

Aos leitores(as) da Revista de Nossa Senhora, meu desejo profundo, para cada um, cada uma, de uma vivência cristã de intensa alegria; e minha prece à Mãe de Jesus que interceda ao seu amado filho para que nós, assim como os apóstolos, possamos ouvir…. “o vosso coração se alegrará e ninguém vos poderá tirar vossa alegria”. (cf. Jo16,22)

Ir. Maria da Luz Cordeiro, fdnsc

o ócio das férias

un niño pensando en soledadO ano gira na dobradiça das férias. Associam-se a tal tempo divertimento, descanso, passeio, viagens. Interrompemos as atividades laborais ou escolares para entregar-nos ao ócio. O termo conserva em Latim tom positivo. Aqueles, que terminavam honradamente as tarefas impositivas da vida, à guisa do aposentado de hoje, os romanos reconheciam gozar do otium cum dignitate. E viam em tal fase da vida a excelente oportunidade para dedicar-se às letras. “O ócio sem letras é como a morte e a sepultura do homem vivo”, pontifica Sêneca.

Se férias e ócio se entrelaçam, a ambos não devem faltar as letras. Não se ocupa o tempo livre, que o termo ócio denota, com vacuidades. Vazio não enche vazio. Ao abrirmos brechas na vida de trabalho e de obrigações escolares, cabe-nos preenchê-las. Vale de todo ser humano a expressão latina de que horret vacuum – tem horror ao vazio.

A questão se impõe como ocupá-lo. Aí está o busílis do assunto. A cultura pós-moderna invade os silêncios com os sons. Criou inúmeros artefatos que batalham todo o tempo o ouvido e o cérebro da nova geração. Dorme ouvindo, acorda ouvindo. Não há pausa. Não há ócio. E então não cabem as letras do ler e do pensar. Só existe o ruído.

Vão sugestões para as férias. Cada dia encontrar no fluir das horas algum tempo para atividades altamente humanas e repousantes: Contemplação, leitura e conversas gratuitas. Às vezes, as três casam, quando lemos algo que nos arranca do livro, projeta-nos para a profundidade interior onde habitam as maiores belezas e terminamos na partilha.

A contemplação alimenta-se da memória. Ela carrega o passado na dupla faceta das experiências gratificantes como das dolorosas. Ambas nos permitem vivenciar a verdadeira humanidade que se constitui de alegrias e tristezas, de prazer e dor, de realizações e fracassos.

No ócio das férias faz bem reviver momentos de beleza do passado, revigorando-nos as energias. E as horas sombrias merecem também olhar de reconciliação com nós mesmos e com as fontes da dor. Tudo isso nos põe próximos dos outros humanos que vivem também experiências semelhantes. Nada nos desumaniza tanto quanto postar-nos como heróis, exceções, sobrenadando ao lado da fragilidade humana. A arrogância existencial destrói-nos o senso de humanidade.

A contemplação tranquila de nós mesmos e da própria vida serena-nos o coração nos tempos de silêncio do ócio das férias. Calar-se não significa tristeza nem incomunicabilidade. Mas refontização para melhorar as relações.

Dois outros espaços abrem-se-nos nas férias. Entregar-nos a leituras que nos imerjam na realidade. E lá nos encontramos retratados. Passeamos por paragens maravilhosas. Some-se a esses voos pelo mundo fascinante da literatura o cultivo das relações pessoais em conversas gratuitas e leves. Como nos enriquecemos ao tagarelar com amigos e ouvir deles as belezas do universo dos livros. Assim o ócio deixa de ser vazio para plenificar-nos a anima e o ânimo.

Pe. João Batista Libânio, SJ (in memorian)

O ano gira na dobradiça das férias. Associam-se a tal tempo divertimento, descanso, passeio, viagens. Interrompemos as atividades laborais ou escolares para entregar-nos ao ócio. O termo conserva em Latim tom positivo. Aqueles, que terminavam honradamente as tarefas impositivas da vida, à guisa do aposentado de hoje, os romanos reconheciam gozar do otium cum dignitate. E viam em tal fase da vida a excelente oportunidade para dedicar-se às letras. “O ócio sem letras é como a morte e a sepultura do homem vivo”, pontifica Sêneca.Se férias e ócio se entrelaçam, a ambos não devem faltar as letras. Não se ocupa o tempo livre, que o termo ócio denota, com vacuidades. Vazio não enche vazio. Ao abrirmos brechas na vida de trabalho e de obrigações escolares, cabe-nos preenchê-las. Vale de todo ser humano a expressão latina de que horret vacuum – tem horror ao vazio.A questão se impõe como ocupá-lo. Aí está o busílis do assunto. A cultura pós-moderna invade os silêncios com os sons. Criou inúmeros artefatos que batalham todo o tempo o ouvido e o cérebro da nova geração. Dorme ouvindo, acorda ouvindo. Não há pausa. Não há ócio. E então não cabem as letras do ler e do pensar. Só existe o ruído.Vão sugestões para as férias. Cada dia encontrar no fluir das horas algum tempo para atividades altamente humanas e repousantes: Contemplação, leitura e conversas gratuitas. Às vezes, as três casam, quando lemos algo que nos arranca do livro, projeta-nos para a profundidade interior onde habitam as maiores belezas e terminamos na partilha.A contemplação alimenta-se da memória. Ela carrega o passado na dupla faceta das experiências gratificantes como das dolorosas. Ambas nos permitem vivenciar a verdadeira humanidade que se constitui de alegrias e tristezas, de prazer e dor, de realizações e fracassos.No ócio das férias faz bem reviver momentos de beleza do passado, revigorando-nos as energias. E as horas sombrias merecem também olhar de reconciliação com nós mesmos e com as fontes da dor. Tudo isso nos põe próximos dos outros humanos que vivem também experiências semelhantes. Nada nos desumaniza tanto quanto postar-nos como heróis, exceções, sobrenadando ao lado da fragilidade humana. A arrogância existencial destrói-nos o senso de humanidade.A contemplação tranquila de nós mesmos e da própria vida serena-nos o coração nos tempos de silêncio do ócio das férias. Calar-se não significa tristeza nem incomunicabilidade. Mas refontização para melhorar as relações.Dois outros espaços abrem-se-nos nas férias. Entregar-nos a leituras que nos imerjam na realidade. E lá nos encontramos retratados. Passeamos por paragens maravilhosas. Some-se a esses voos pelo mundo fascinante da literatura o cultivo das relações pessoais em conversas gratuitas e leves. Como nos enriquecemos ao tagarelar com amigos e ouvir deles as belezas do universo dos livros. Assim o ócio deixa de ser vazio para plenificar-nos a anima e o ânimo.

Pe. João Batista Libânio, SJ (in memorian)

Partir do “Coração do Evangelho”

catequeseDepois de refletir sobre “Uma Igreja «em saída»” e sobre a “Conversão Pastoral”, o Papa Francisco na Exortação Apostólica “A Alegria do Evangelho” procura mostrar-nos que a transformação missionária da Igreja só será possível a partir do coração do evangelho. O núcleo da reflexão do Santo Padre é este: devemos ter presente que o conjunto das verdades reveladas propostas pela Igreja tem um centro, uma espécie de Sol, em torno do qual gravitam todas as outras afirmações da fé e que a elas confere seu sentido pleno. Sem a compreensão desse centro – o coração do evangelho – muitos ensinamentos da Igreja, embora baseados na revelação, tornam-se incompreensíveis e desinteressantes para as pessoas insuficientemente iniciadas na vida cristã. A título de exemplo: quem não fez a experiência do amor de Deus pela humanidade, oferecido a nós em Cristo, não pode compreender o significado da indissolubilidade do matrimônio.

E é preciso retomar sempre o coração do evangelho para que não passemos a impressão de que muitos ensinamentos da Igreja são imposição de dogmas ou de preceitos que ferem a liberdade humana e se opõem ao desejo e ao direito de ser feliz. A propósito assim se expressa o papa: “O problema maior ocorre quando a mensagem que anunciamos parece então identificada com tais aspectos secundários, que, apesar de serem relevantes, por si sozinhos, não manifestam o coração da mensagem de Jesus Cristo. Portanto, convém ser realistas e não dar por suposto que os nossos interlocutores conhecem o horizonte completo daquilo que dizemos ou que eles podem relacionar o nosso discurso com o núcleo essencial do Evangelho que lhe confere sentido, beleza e fascínio”(n. 34).

“Quando se assume um objetivo pastoral e um estilo missionário, que chegue realmente a todos sem exceções nem exclusões, o anúncio concentra-se no essencial, no que é mais belo, mais importante, mais atraente e, ao mesmo tempo, mais necessário.”(n. 35) E mais adiante o Papa diz qual é o coração do evangelho: “Neste núcleo fundamental, o que sobressai é a beleza do amor salvífico de Deus manifestado em Jesus Cristo morto e ressuscitado.”(n.36). Quando no capítulo terceiro o Santo Padre trata do “Anúncio do Evangelho”, ele retoma de maneira mais clara qual é o coração do evangelho: “Voltamos a descobrir que também na catequese tem um papel fundamental o primeiro anúncio ou querigma, que deve ocupar o centro da atividade evangelizadora e de toda a tentativa de renovação eclesial.

O querigma é trinitário. É o fogo do Espírito que se dá sob a forma de línguas e nos faz crer em Jesus Cristo, que, com a sua morte e ressurreição, nos revela e comunica a misericórdia infinita do Pai. Na boca do catequista, volta a ressoar sempre o primeiro anúncio: «Jesus Cristo ama-te, deu a sua vida para te salvar, e agora vive contigo todos os dias para te iluminar, fortalecer, libertar». Ao designar-se como «primeiro» este anúncio, não significa que o mesmo se situa no início e que, em seguida, se esquece ou substitui por outros conteúdos que o superam; é o primeiro em sentido qualitativo, porque é o anúncio principal, aquele que sempre se tem de voltar a ouvir de diferentes maneiras e aquele que sempre se tem de voltar a anunciar, duma forma ou doutra, durante a catequese, em todas as suas etapas e momentos. Por isso, também «o sacerdote, como a Igreja, deve crescer na consciência da sua permanente necessidade de ser evangelizado». (n. 164). Traduzindo de forma prática a última frase desse trecho: Todos os dias eu devo de novo deixar ressoar em mim o coração do evangelho, o querigma. Sem essa volta às raízes o ensinamento da Igreja, sobretudo em matéria de moral, se torna um peso por não ser mais a resposta de amor que o discípulo deve dar a seu Senhor.

Aqui temos o maior desafio para a evangelização. Como, por ex.,oferecer uma catequese aos jovens que lhes penetre a vida se esses jovens não foram tocados pelo pessoa de Cristo a ponto de sentirem fome e sede de sua palavra? Sem a experiência do coração do evangelho, o conjunto das verdades da fé e dos preceitos morais do decálogo parecerão uma imposição vinda de fora e não valores que abrem caminho para uma vida humana digna e mais feliz. Finalizo este artigo com a palavra do Papa Francisco: “O Evangelho convida, antes de tudo, a responder a Deus que nos ama e salva, reconhecendo-O nos outros e saindo de nós mesmos para procurar o bem de todos…Se tal convite não refulge com vigor e fascínio, o edifício moral da Igreja corre o risco de se tornar um castelo de cartas (papel), sendo este o nosso pior perigo; é que, então, não estaremos propriamente a anunciar o Evangelho, mas algumas acentuações doutrinais ou morais, que derivam de certas opções ideológicas. A mensagem correrá o risco de perder o seu frescor e já não ter «o perfume do Evangelho»”(n.39).

Dom Eduardo Benes de Sales Rodrigues – Arcebispo de Sorocaba (SP)

A CEIA PASCAL e o anúncio da traição de Judas

Jesus breaks the breadO inesperado e o imprevisto:

Os evangelhos dedicam vários capítulos para apresentar o relato da Paixão e Morte de Jesus. É uma descrição dramática e envolvente. Cada momento vivido por Jesus é denso e ao mesmo tempo de uma profundidade imensa. O Filho de Deus começa a seguir de forma definitiva, agora, o caminho da cruz. O inesperado acontece. Ninguém imaginava como poderia se concluir este fato. É impossível descrever o que se passa no coração do Mestre. Tudo vai culminar na entrega total ao Pai, lá no alto da cruz. Acabam-se os discursos de Jesus. Chega à hora de sofrer em silêncio.

Lideranças que provocam morte:

Os evangelhos põem em relevo o papel desempenhado por Caifás, que era genro de Anás. Caifás foi Sumo Sacerdote, isto é, chefe supremo do templo de Jerusalém e presidente do Sinédrio entre os anos 18 a 36 de nossa era cristã. Eles associam os anciãos do povo aos sumos sacerdotes; isto é, aqueles que tinham mais influência na casta sacerdotal. Então se reúnem as “lideranças perversas” para decidirem à prisão e execução de Jesus. Pensam até em marcar uma data para isso, mas a festa da Páscoa devia ser celebrada em paz e qualquer tumulto popular provocava a repressão por parte dos soldados romanos. O medo das lideranças supõe que o povo que seguiu Jesus não estaria de acordo com tal decisão tomada na clandestinidade e combinação diabólica.

Ao escurecer já começava o novo dia:

Treze pessoas era um número aceitável para uma ceia de páscoa; normalmente era só a família que se reunia para tal evento, em torno de cinco a dez pessoas. Os doze com Jesus têm agora um sentido novo: o novo Israel celebra a nova Páscoa. A família de Jesus agora são seus doze discípulos.

Os lugares à mesa:

Jesus dará “sua carne e seu sangue” para a vida do mundo. Os lugares à mesa eram ocupados conforme o critério de idade. Esta ordem era observada de forma escrupulosa. Jesus quebra esta ordem, colocando João ao seu lado, o mais novo; aquele que no dia seguinte estaria aos pés da cruz, com Maria. Daí a discussão entre os discípulos para ver quem ficaria mais perto de Jesus. Eles ainda deviam superar as ambições.

Simples mas solene:

A última ceia foi celebrada na simplicidade, mas sem deixar de ser solene. Os discípulos nem podiam imaginar que aquela ceia iria tornar-se o coração da Igreja nascente e perpetuar-se para sempre. O que será que se passava no coração de Judas Iscariotes? É impossível descrever. Os demais discípulos nem podiam imaginar o que estava para acontecer.

Trevas e sombras:

Judas entendeu que seu plano fora descoberto por Jesus. As palavras duríssimas que Jesus diz a respeito dele continuam nos impressionando muito: – “Seria melhor para esse homem não ter nascido” (Mt 26,24). Pedro sentia-se angustiado pela incerteza. Não conseguia resistir, fez um sinal para o seu amigo João, que estava ao lado do Mestre e este perguntou diretamente, quem seria o traidor. Jesus respondeu a João com um fio de voz: – “É aquele que eu der um pedaço de pão embebido no vinho” (Jo 13,26). Aquele era um gesto simbólico com que à mesa, se demonstrava simpatia e amizade por alguém. Jesus tentou assim, mais uma vez salvar uma alma perdida, mas Judas, pelo contrário ficou ainda mais sombrio, pois “satanás entrou nele”; sentiu um profundo ódio por sua vítima. Judas levantou-se da mesa e saiu sem dizer uma palavra. As trevas da noite o envolveram. Agora os laços com Jesus estavam mesmo cortados.

Fracasso e humilhação:

Jesus celebra e institui “sua eucaristia” e manda celebra-la em sua memória. Jesus não come, mas se entrega. Ele parte o pão para repartir e assim os seus discípulos podem fazer o mesmo. Jesus anuncia em seguida o fracasso e humilhação que os discípulos vão passar. É um anúncio trágico. Os discípulos vão tropeçar na grande prova e se dispersarão como ovelhas, mas sua queda não será definitiva, porque o pastor ressuscitado voltará a reuni-los na Galiléia (Mt 28,10).

O momento se aproxima:

Na noite da refeição pascal era proibido sair de casa, mas Jesus “transgrediu” esta regra da antiga tradição, temendo pela segurança dos apóstolos, pois poderiam facilmente ser presos na sala onde haviam ceado. Judas, percebendo que não havia mais ninguém na sala, conduziu os soldados até uma propriedade afastada, que ficava no outro lado do Cedron. Este lugar era conhecido de Judas, pois muitas vezes já estivera com Jesus lá. Era chamado de Horto das Oliveiras; em hebraico, de “Getsêmani”, que significava o lugar onde havia uma prensa para a produção do azeite de oliva. Esta foi à última saída de Jesus com seus discípulos, antes de sofrer a Paixão.

Dom Agenor Girardi, MSC – Bispo Auxiliar de Porto Alegre – RS

A ética da dor

teen depression, tunnelSe a dor desaparecesse totalmente do corpo humano, não se controlariam os perigos para a saúde. Ela serve de alerta, sinal, sintoma de que algo não funciona bem no corpo e conduz o médico à busca de diagnóstico correto.

A dor continua sendo espinho na experiência humana. A complexidade do ser humano a faz bater no corpo, na alma, no espírito. E a luta continua para aboli-la em todos os campos. No horizonte caminha-se para vitória total contra ela ou trata-se de ilusão? A dor só possui valência negativa a ser negada? Negar a negação significa avanço, conforme a mais comezinha aritmética: menos vez menos é mais. Ou será que a dor pertence às experiências fundamentais da vida humana e possui aspecto positivo? E negar totalmente o positivo não nos leva segundo a mesma aritmética ao negativo? Mais vez menos é menos. Eis a pergunta ética.

A medicina navega entre o rochedo de Cila e o turbilhão de Caríbdis no Estreito de Messina. Com a anestesia tem eliminado a dor física. Ela incomoda e, às vezes, inutilmente e com algum anestésico se elimina. Benditos pro-gressos da medicina que nos poupam de tanto sofrimento físico!
Entretanto tem-se criado perigosa cultura da eliminação de qualquer dorzinha por crescente dose de analgésicos que as pessoas tomam por conta própria. Não toleram nenhum incômodo parecido com dor.

Vejamos o risco. Se a dor desaparecesse totalmente do corpo humano, não se controlariam os perigos para a saúde. Ela serve de alerta, sinal, sintoma de que algo não funciona bem no corpo e conduz o médico à busca de diagnóstico correto. Sem sinais dolorosos, a morte chegaria antes de se descobrir a doença. Bendita dor salvadora! A ética não abona o uso exagerado de analgésico da cultura atual por causa da insuportabilidade do mínimo sinal de sofrimento. Atenção à perniciosa propaganda da indústria farmacêutica!

E quando a dor atinge a psique? Aí a situação se complica. Ela não cede instantânea e definitivamente à cura da medicina. Cede diante de antidepressivos, mas passado o efeito do remédio, volta. E, não raro, mais forte. Revela com maior clareza a fragilidade humana.

Há pessoas que sofrem longos períodos de depressão. E algumas não o suportam e terminam tirando-se a vida ou metendo-se em drogas violentas que levam ao mesmo fim. Se o ser humano não se educa a conviver e a trabalhar a dor psíquica, viverá escravo de remédio.

De novo, entra a ética da dor. Não se trata de eliminar sem mais o sofrimento psíquico, mas de ajudar as pessoas humanas a assumirem a si mesmas sem ilusões de felicidades fáceis. Momentos de solidão, de dor interior fazem parte do crescimento humano. Ensinam a pessoa que quanto mais fechar-se e prender-se a si mesma, mais afundará na noite afetiva. E a saída para os outros, ações de solidariedade, empenho em serviços altruísticos a ensinarão encontrar a paz que os prozacs só oferecem artificial, superficial e momentaneamente.

E a dor do espírito? Diferente. Dorme em cada ser humano, mesmo que não saiba e não queira admitir, o infinito do Deus criador que o chamou para si. Dor de eternidade. Nenhuma medicina cura. Só o cultivo da espiritualidade e do amor dedicado aos irmãos canaliza tal inquietude dolorosa. Santo Agostinho, atormentado por ela, exclamou: Inquieto, Senhor, está o nosso coração até que descanse em ti!

Pe. João Batista Libânio, SJ
(in memorian)

Milagre Eucarístico de Orvietto / Bolsena – Itália 1263

Duomo di OrvietoVocê acha que algum padre pode duvidar da presença de Jesus na Eucaristia? “Não”, seria a sua resposta, mas o milagre eucarístico que tratamos neste mês aconteceu pela falta de fé de um sacerdote que era conhecido por ser muito piedoso, mas a dúvida sobre a presença de Cristo na Eucaristia o atormentava há muito tempo. Este padre chamava-se Pedro de Praga.

De um lado um sacerdote que duvidava, do outro, um grupo chamado Cátaros que procurava combater, entre outras verdades da fé, a presença de Jesus na Eucaristia. A Igreja, por isso, enfrentava uma grande crise dos fiéis atordoados com tantas manifestações contrárias à fé.

Pe. Pedro, o sacerdote que duvidava, decidiu peregrinar até Roma e ao parar num povoado chamado Bolsena, próximo a Orvietto, celebra uma missa no altar de Santa Cristina. No momento da consagração, Deus lhe dá um ultimato sobre a sua fé na Eucaristia e, portanto, da hóstia começa a sair sangue. Ele tenta em vão esconder tal fato, mas algumas gotas de sangue caem no corporal e respingam sobre o altar. Não se esconde de Deus as maravilhas que Ele quer que conheçamos.

Por ocasião do verão, o Papa Urbano IV estava em Orvietto e foi para lá que Pe. Pedro se dirigiu. Sendo acolhido, o Papa o ouviu e imediatamente tomou providências sobre o acontecido. Munido de prudência e sabedoria, pediu a Deus que lhe desse, de fato, um sinal de Sua providência. Tendo os fatos analisados e a grande devoção à Eucaristia criando corpo na Igreja, um ano depois, o Papa Urbano IV instituiu a Festa de Corpus Christi.

Até hoje, o corporal – pequeno tecido quadrado que é colocado sobre o altar onde se consagram as hóstias – é visitado por milhares de fiéis na Catedral de Orvietto. E no mundo inteiro, graças a este milagre podemos celebrar a Festa da Eucaristia, a festa que une o coração de todos os cristãos.

A Redação

Segurar e Soltar

interna2Você faz isso como seu cãozinho quando sai a passeio, faz com seu carro, faz consigo. Não há porque não fazer com os filhos. Há hora de soltar a cordinha, o anzol e os freios de mão e de pé. Há hora de frear, prender e segurar, por mais que o cãozinho queira, por mais que o peixe se debata, por mais que seu filho teime. Um dia, ele ou ela terá condições de ir aonde quer, mas agora, não. Ele ou ela reagirá dizendo que sabe, mas não sabe; que saberá se cuidar, mas não saberá. Erro dele ou dela se insistir numa liberdade para a qual não está pronta. Você não pode nem deve ceder. Conforme o caso, o juiz poderá decretar prisão para o casal omisso. Não se solta um filho despreparado para ir…

Mas será erro seu se, estando o filho ou a filha, em condições de ir, por ter idade e, mais do que idade, maturidade para ir você prender ou segurar. E é o que com muitos subterfúgios alguns casais fazem. Mães possessivas ou grudentas demais atrapalham a vida afetiva e o crescimento do seu meninão ou da sua moça. Interferem nos namoros e na liberdade. Os filhos de tais pais ou mães precisam de ajuda para libertar-se, mas tais pais ou mães precisam de ajuda para aprender a soltar sem sofrer chiliques.

Se isto ainda existe? Pois é. Numa era de tanta liberdade e de tanto individualismo há milhares de moçoilos e moçoilas de 35 s 40 anos que não conseguem nem sair do ninho, nem montar o próprio, nem amar o suficiente uma outra pessoa de qualidade, porque o aconchego doméstico virou suave jaula. Os pais não soltam e eles ou elas não querem.

Se é bom? Perguntem aos estudiosos da alma. Em geral não é!

Pe. Zezinho. SCJ, é músico e escritor. Tem aproximadamente 85 livros publicados e mais de 115 álbuns musicais. www.padrezezinhoscj.com

Não celebro MISSAS…

interna1Segunda-feira de manhã. Entro na padaria para comprar uns biscoitinhos. A jovem balconista me dirige um olhar interrogativo. Cria coragem e pergunta:

- Foi o senhor quem celebrou a missa ontem à noite, não foi?

Com um meio sorriso, respondo:

- Não foi missa, não é? Foi uma celebração da Palavra…

É claro que a jovem ficou meio enrolada, pois grande parte dos

fiéis não faz nenhuma diferença entre duas realidades tão díspares: a Eucaristia plena, com ofertório, consagração e comunhão, e uma reunião em torno da Palavra de Deus, na ausência do sacerdote.

Lembrei-me de um artigo da teóloga Maria Clara Bingemer, no qual ela citava o depoimento de uma senhorinha que participava de uma comunidade rural:

- “Aqui, nóis tem a missa do padre e a missa da freira… Mais nóis prefere a missa da freira!”

Na verdade, o engano dos fiéis é favorecido por um desvio litúrgico muito comum: utilizar o mesmo folheto da missa, seguindo passo a passo os mesmos elementos que compõem a missa, sem excluir as partes típicas da Liturgia Eucarística. O moderador ou animador leigo chega a ocupar indevidamente o altar – exclusivo do Sacrifício da Missa! – e assume gestos e palavras exclusivamente presidenciais, como certas saudações e fórmulas de despedida.

Questionado por incluir o cântico processional das oferendas em uma celebração da Palavra, o ministro leigo retrucou:

- Mas, se não tiver ofertório, como vamos fazer a coleta? (sic)

Em nossa paróquia, os ministros extraordinários da Palavra foram muito bem orientados. Tiveram acesso ao texto da Congregação para o Culto Divino que trata das celebrações dominicais na ausência do presbítero (Ed. Vozes – Coleção Documentos Pontifícios, nº 224). Ali se aprende que, quanto mais a celebração da Palavra se parece com a missa, tanto pior!

Aprendemos que as passagens presidenciais (como a oração do dia ou após a comunhão) passam para a Assembleia, na ausência do sacerdote, mas não competem ao ministro leigo isoladamente.

Um recurso prático para distinguir entre a Santa Missa e a celebração da Palavra consiste em “remexer” com a ordem dos elementos da celebração. Por exemplo, deixar o Hino de Louvor para depois do Evangelho. Ou ainda, adiar o Ato Penitencial como preparação logo antes da Comunhão. Durante os anos em que fui redator de um folheto específico para celebrações da Palavra, sob a supervisão do Pe. Paschoal Rangel, na Editora O Lutador, recorri habitualmente a esse procedimento.

Como ensina o Documento citado, “o leigo que orienta a reunião comporta-se como um entre iguais”, como sucede na Liturgia das Horas, quando o ministro é leigo: ‘O Senhor NOS abençoe’… Não deve usar a cadeira presidencial, mas outra cadeira, fora do presbitério. O altar servirá apenas para os Ministros da Comunhão depositarem as espécies consagradas antes de sua distribuição.

Estas recomendações são datadas de 1988. Ao que parece, poucas comunidades foram informadas…

Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança

Milagre Eucarístico de Benningem – Alemanha

Russisch-Orthodoxe Kirche der heiligen Elisabeth in WiesbadenA vingança nunca traz boas consequências. O vingador premedita, maldiz e, normalmente, tem por trás de seus gestos a vontade de prejudicar alguém. O milagre que apresentamos neste mês possui esta característica: a vingança. Entenda bem: dois trabalhadores de moinho tiveram ao longo da vida muitas discussões. Diante de brigas comuns desentenderam-se de maneira mais incisiva durante um tempo. A ira apossou-se de um deles que, depois de participar da santa missa e ter comungado, roubou uma partícula consagrada e a escondeu no moinho do outro. Um sentimento de vingança o fez agir assim para que toda calúnia recaísse sobre o outro. Para o caluniador a missa foi apenas um álibi para premeditar, roubar e deixar que o outro sofresse por sua atitude impensada.

Ele esqueceu-se, portanto, que a misericórdia de Deus providencia a justiça e numa festa de São Gregório, a hóstia escondida começou a verter sangue de maneira abundante. Arrependido, o moleiro, que trabalha no moinho, confessou seu crime. O caso, claro, tornou-se conhecido das autoridades eclesiásticas que junto com a comunidade local providenciou a construção de uma pequena capela em honra ao milagre. Com o passar do tempo a relíquia do milagre não foi mais encontrada e atribui-se a isso diversos acontecimentos históricos. Fica, portanto, a mensagem objetiva do milagre. Diante de Deus não pode haver falsidade. É preciso ser justo, fiel e honesto com as pessoas. As adversidades devem ser tratadas claramente e com discernimento.

Desejar o mal a alguém e, mais ainda, propiciar para que este mal aconteça é suscitar em nós sentimentos que deveriam ser banidos do coração. Não podemos criar a nossa história sobre as desgraças dos outros, principalmente se somos nós os causadores delas. Neste milagre de Benningem fica registrado que não se deve construir relacionamentos baseados no ódio ou vingança. Eles jamais prevalecerão diante do amor, misericórdia e justiça de Deus.

Pe. Air José de Mendonça, MSC é pároco e reitor do Santuário de Nossa Senhora do Sagrado Coração, em Vila Formosa, SP.

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